domingo, 6 de outubro de 2013

Consciência corporal na dança e no esporte

Qual a importância de conhecer o próprio corpo na prática de uma atividade física?

     Ao se ter uma consciência parcial do corpo, quase sem exceção, esportistas e dançarinos o deformam às vezes de forma monstruosa, por não conhecerem a interdependência dos músculos e seus antagonistas, por não saberem usar os músculos mais apropriados ao esforço, vão tirando forças de onde não podem. Forçam-se e forçosamente machucam-se. Afinal porque lutar, ultrapassar-se significa quase sempre punir-se para atingir um resultado desejado? Qual a solução? Acabar com a dança, ou o esporte? Talvez esse não seja o melhor caminho, mas sim pensar na possibilidade de começar toda e qualquer atividade com o corpo e não com a atividade em si. Ou seja, perceber que antes de começar qualquer coisa, é preciso adquirir inteligência muscular, sensorial, respiratória, sabendo usá-la diariamente e não apenas nas férias. Ao invés de fechar-se dentro de gestos transmitidos, de aceitar o adestramento é preciso dar espaço ao corpo e ao cérebro de inventar os movimentos apropriados, podendo assim descobrir uma aptidão a quaisquer atividades físicas. Perceber-se diariamente no simples andar do cotidiano, na postura adquirida, nos vícios enraizados..."a gente não fica doente; a gente vai ficando aos poucos, durante anos de abuso e inconsciência." 

     Nunca é tarde demais para oferecer ao corpo um descanso. Exige uma certa humildade, mas a gente é altamente recompensado pela alegria do movimento que se tornou correto, pelo renascimento das sensações, pelo corpo que se vê enfim livre para viver a vida de verdade.

    "Qualquer distúrbio da capacidade de sentir plenamente o próprio corpo corrói a confiança em si, como também a unidade do sentimento corporal; e cria, ao mesmo tempo, a necessidade de compensação." (W. Reich, p.277).


        É preciso também ter cuidado, pois para compensar a incapacidade de sentir o próprio corpo, para diluir o mal-estar por vezes inconsciente que se desprende das zonas mortas, alguns recorrem à imitação, no caso, do adestramento do corpo e não da tomada de consciência de movimentos que o próprio indivíduo teria encontrado e amadurecido através do uso, tanto do cérebro , quanto dos músculos.
          Se não conhecemos o uso do corpo, se nosso repertório de gestos e movimentos só comporta uma fração das possibilidades de que o ser humano é capaz, se até agora só usamos o corpo para reduzir, trair ou negar nossas sensações, é evidente que a expressão corporal, tanto quanto o esporte, não pode passar de imitação, compensação, adestramento. Antes de realizar quaisquer atividades físicas, há um trabalho preliminar a fazer: a tomada de consciência do corpo. Como o pintor prepara a tela e o escultor, o barro, devemos preparar o corpo antes de usá-lo, antes de esperar dele "resultados satisfatórios". É o estado do corpo que, a priori, determina a riqueza das experiências vividas. O corpo lúcido toma iniciativas, não se contenta mais com receber, aguentar, "engolir". Ao tomar consciência do corpo, damos-lhe a ocasião de comandar a vida.

Do livro: O corpo tem suas razões: antiginástica e consciência de si/ Thèrèse Bertherat, com a colaboração de Carol Bernstein; tradução Estela dos Santos Abreu. - 18ª ed. - São Paulo: Martins Fontes, 1998.

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